DOCUMENTO DE APRESENTAÇÃO
1. Breve histórico das Conferências de Aljustrel
Fruto do processo da "Agenda 21 Local de Aljustrel" realizado de 2011 a 2013, do qual resultou o "Plano Estratégico para o Concelho de Aljustrel", que apontava para grande abertura ao "exterior" para debates enriquecedores, foi decido nos finais de 2013 a realização das "Conferências de Aljustrel", no quadro do lema "Cidadania, Inovação & Território".
Realizaram-se, assim, em Abril com um programa de dois dias plenos, recheado de Investigadores na matéria e personalidades com regular opinião pública no primeiro dia e no segundo, com protagonistas de projetos nas "baixas densidades" de diversos territórios do país, que culminou com uma excelente Conferência de Encerramento.
Tendo sido consideradas "uma pedrada no charco", nos largos tempos em que os "Interiores" esquecidos, e feito um balanço muito positivo, o Município de Aljustrel decidiu que as Conferências "vieram para ficar".
Em 2015 realizou-se a 2ª edição, tendo-se assumido que passavam a bienais, e em 2017 a 3ª edição.
Nas três edições debateram-se as matérias-questões, tais como: a Crise Demográfica, a Inovação Social e Económica, Programas para o Desenvolvimento Territorial, o Marketing Territorial, o papel das Diásporas, as Migrações, a Fixação & Atratividade e o papel das Redes Territoriais, sempre com Conferências de Encerramento com pistas para o que há a realizar. Ver informação sobre edições anteriores em www.conferenciasdealjustrel.com
2. As Conferências de Aljustrel 2019, 4ª edição
Nesta Edição, com o lema de sempre, iremos ter temáticas mais precisas e claramente na ordem do dia, agora que houve um geral acordar para o "Interior" e para a coesão territorial do todo nacional, matérias para o qual urge dar pistas e respostas que efetivem o agora largamente proclamado.
Neste quadro, a temática central será "Descentralização e Programações para o Desenvolvimento dos "Interiores", com Coesão Territorial Nacional".
Para que apresentações e debates possam ser esclarecidos e propositivos, apresentamos dois painéis temáticos; a saber:
Painel 1 - "A Descentralização de Competências para o Desenvolvimento dos Territórios de Baixa Densidade";
Painel 2 - "Programas Nacionais de Desenvolvimento para um País Diverso".
Quer num, quer noutro, vamos contar com responsáveis políticos, especialistas nas matérias e personalidades com regular opinião pública e como moderadores, jornalistas de dimensão nacional.
Um relator convidado, irá assegurar a apresentação das linhas mestras do concluído.
Num segundo dia, de manhã, teremos a oportunidade de mostrar dois exemplos do que no Concelho de Aljustrel se vem realizando, com investimento público, a bem do nosso território, a saber: "Parque Mineiro de Aljustrel" e "Centro de Estudos Geológicos e Mineiros do Alentejo".
Findaremos com degustação de produtos locais e convívio, no Centro de Artes d´ Aljustrel.
Aljustrel, 9 de Janeiro de 2019
Descentralização e Desenvolvimento dos Interiores com Coesão Territorial Nacional
Talvez já tudo tenha sido dito e escrito sobre estes temas: de forma abstrata ou com exemplos concretos, elaborando diagnósticos ou valorizando memórias e experiências, apresentando opções políticas e programas ou acenando com sonhos e utopias. Com as convergências e dissonâncias habituais, umas quanto a questões de fundo, outras quanto à melhor estratégia a prosseguir, outras ainda quanto às condições e capacidades de concretização dos caminhos a percorrer e dos objetivos visados, há em Portugal um debate de décadas sobre estes temas que não deixa de nos interpelar: por que estamos ainda a discutir estas questões?
Na verdade, há boas razões para o fazermos. Porque no nosso país estes temas persistem na agenda política e das políticas como questões por resolver, porque é necessário aprofundar aspetos que se renovam permanentemente num mundo em rápida mudança, porque, muito pragmaticamente, estamos às portas de um novo ciclo de programação financeira comunitária que deve ser preparado com antecipação. Tudo isto é correto, tudo isto é... fado!
E no entanto... talvez valha a pena olhar para a equação descentralização - desenvolvimento dos interiores - coesão territorial nacional a partir de um outro olhar, não o dos decisores políticos, académicos, técnicos da administração, agentes económicos e sociais, mas antes o dos cidadãos vulgares, os que não fazem parte das elites - nacional, regional ou local - que têm o poder e a capacidade de decidir, influenciar, concretizar.
Mas como transformar o cidadão vulgar dos interiores do país de mero beneficiário dos processos de descentralização, de objeto passivo de programas de desenvolvimento territorial, de alvo de uma maior coesão nacional, em sujeito e ator de iniciativas e objetivos tão complexos? E mesmo que o cidadão vulgar, na sua enorme diversidade etária e socioprofissional, seja escutado, participe, colabore, coprotagonize iniciativas e soluções, em suma, se transforme de objeto em sujeito, de espectador em ator, de alvo em atirador, isso garante que iremos encontrar respostas mais adequadas, robustas e criativas para a equação descentralização - desenvolvimento dos interiores - coesão territorial nacional?
A resposta a ambas as questões é muito simples: não sabemos. E se não sabemos teremos de indagar, descobrir, experimentar. Com a crença de que o cidadão vulgar tem informação, conhecimento e sabedoria que não podemos desperdiçar.
Populismo? Sim, mas pedagógico e inclusivo: um alerta sério para o facto de os debates entre elites, sendo incompreensíveis para os cidadãos vulgares, poderem alimentar nestes últimos o sentimento de que os assuntos em discussão não lhes dizem respeito, de que são sistematicamente esquecidos, abrindo as portas para que os seus corações sejam mobilizados por outros populismos, que lhes prometem um futuro que, a concretizar-se, seria, por certo, o caminho mais direto para a sua definitiva marginalização. Comecemos, por exemplo, por os envolver no debate sobre a criação de regiões administrativas em Portugal, um assunto que, para a maioria, parecerá longínquo, enigmático e sem ligação evidente com os seus quotidianos.
João Ferrão
Geógrafo
Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa
Sobre a oportunidade das Conferências de Aljustrel
Aproxima-se mais uma Conferência de Aljustrel e nova ocasião para um amplo debate sobre as desigualdades territoriais do país, em particular sobre a reiterada fragilidade e incoerência das políticas nacionais em prol da coesão territorial. Os temas deste ano prendem-se com as recentes iniciativas políticas para a descentralização, contando com a participação de elementos do governo que conduziram e que acompanham o processo com vista ao cumprimento deste desígnio, e passam ainda pela apresentação de ações programáticas com vista ao desenvolvimento dos chamados territórios de baixa densidade.
É consensual a necessidade crítica de políticas de coesão e sustentabilidade do território, superando um centralismo paralisante e combatendo a desigualdade e os desequilíbrios territoriais. Promover a coesão nacional é hoje um imperativo ético e político, exigindo-se justiça, planeamento, inteligência e eficiência na utilização e partilha dos recursos. Um país justo e sustentável garante a todos os seus habitantes as necessidades básicas em saúde, alimentação e educação, salvaguardando o bem estar ecológico, social e económico.
As instituições de ensino superior devem contribuir para uma estratégia de desenvolvimento integrado do país, através da produção e translação de conhecimento, e enquanto agentes dinâmicos nos territórios em que se inserem, designadamente apoiando e fomentando a fixação de jovens qualificados e criativos. As redes de conhecimento que as instituições de ensino superior podem criar e apoiar, numa articulação fecunda com a atividade económica, são parte da prescrição que precisamos para contrariar o rumo de abandono e de desigualdade que prevalece. Neste sentido, é da maior importância a modernização e valorização dos institutos politécnicos, apoiando a investigação nestas instituições e as sinergias que devem estabelecer e fortalecer com a atividade económica local e regional.
Em toda esta dinâmica de rede, a administração local tem um papel essencial. Em rigor, nestes territórios, muito pouco se conseguirá fazer sem o envolvimento efetivo das autarquias. É importante identificar e alinhar projetos de investimento, com rigor e eficácia, desenvolvendo metodologias mais expeditas de execução, minimizando o prejuízo de uma teia complexa e desajustada de procedimentos, procurando fomentar e diversificar o emprego, e apostando na valorização dos recursos endógenos.
É fundamental ir ao encontro das preocupações e necessidades de todos os portugueses, em especial dos mais frágeis, identificando e desenhando as soluções para os seus problemas, garantindo o acesso aos serviços públicos essenciais, da saúde à educação, da justiça à cultura.
Helena Freitas - Investigadora e Comentadora
Hoje, mais do que nunca...
Portugal tem um problema territorial. Sempre teve. Mas, hoje em dia, há coisas novas, perturbadoras, que merecem atenção redobrada.
Os problemas persistentes são conhecidos: escassa capacitação institucional e política dos diferentes espaços infranacionais, centralização excessiva, uma lógica centro-periferia férrea e a sem grandes mecanismos de contraposição, coesão social e territorial sempre em risco.
Quais são, então, as questões de hoje? Há alguma coisa original nos tempos que correm? A meu ver, há. O Portugal de hoje é, pela primeira vez na nossa contemporaneidade, uma sociedade reduzida a uma forma de crescimento unipolar, centrado em Lisboa. A capital tornou-se único local de afluência de pessoas, dispõe de uma larga oferta de mão-de-obra, que usa intensivamente, a baixo custo e com relevo para as formas precárias. Mas valoriza pouco os recursos de que dispõe e cria menos riqueza do que devia. É uma forma de crescimento periférico, ele próprio, com a periferia da metrópole lisboeta a inchar sem que ela própria seja uma parte incluída do que parece ser uma afluência enorme.
Mas o país não foi sempre assim. Houve outras dinâmicas que complementavam as da capital: outro lugar com potencial metropolitano; um sistema urbano que, embora de forma desigual, ia dando alguma ossatura ao país, inclusive no interior geográfico; um conjunto de espaços mais ou menos inter-relacionados que distinguiam o litoral e lhe davam alguma continuidades.Não é assim hoje.
Convém lembrar, no entanto, que o território não desapareceu. Subsiste um país difuso. De forma relativamente autónoma vão resistindo ou vão até renovando-se pequenas economias locais não submersas pela tendência pesada da concentração metropolitana. Mas são cada vez mais periféricas. Por isso justificam atenção e interlocutores. E estes não são os municípios nem as chamadas comunidades intermunicipais. Deverão ser regiões com legitimidade democrática com as quais se pode simplificar e coordenar a administração.
Por tudo isto, hoje, mais do que nunca, descentralização, desenvolvimento e coesão territorial são questões essenciais. Mais essenciais ainda do que ontem, porque se atingiu um ponto limite, provavelmente um ponto sem retorno. Mas importa saber que o contexto em que discutimos tais temas mudou. Há menos capacidade urbana distribuída no território, há mais urgências na capital, há menos país para conjugarmos forças. Importa resistir e propor, como se faz em Aljustrel e na suas Conferências. Assim como importa criar-se uma consciência larga da enorme disseminação de fragilidades. É preciso ousar pensar um país inteiro.
José Reis
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Centro de Estudos Sociais
Edição - 2015
Edição - 2017